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Decisão do STJ sobre taxação de aplicações pode contaminar outros casos

decisão do Superior Tribunal de Justiça que estabeleceu que a correção monetária de aplicações financeiras configura receita bruta, sendo parte do lucro operacional, e, portanto, passível de cobrança do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), tem potencial para afetar outro casos e abrir caminho para uma tributação ampla de ganhos oriundos de correção monetária de pessoas jurídicas e físicas. 

Esse foi o entendimento da maioria dos advogados tributaristas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

Alane Stephanie Muniz, do escritório Juveniz Jr. Rolim Ferraz Advogados Associados, entende que a decisão do STJ é um paradigma importante por abrir caminho para que os tribunais passem a tributar a correção monetária de maneira muito

“Existe correção monetária em basicamente tudo que a gente faz. A possibilidade de pegar o pensamento jurídico que levou a decisão do STJ e aplicar em outros casos será muito prejudicial para o contribuinte”, explica ela. 

Contratos de financiamento com parcelas corrigidas pela taxa Selic, por exemplo, são bastante discutidos judicialmente, já que os valores acrescidos representariam um mero reajuste do montante parcelado. Um caso de recomposição patrimonial e não de lucro. 

Carlos Marcelo Gouveia, da banca Almeida Prado & Hoffmann Advogados, pensa de maneira parecida. O especialista explica que nesse sentido o entendimento firmado pelo STJ conflita com decisão do Supremo Tribunal Federal (Tema 962) que afastou a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a Selic na restituição do indébito tributário, dada a natureza dúplice da referida taxa, a qual inclui tanto os juros de mora quanto a inflação.

O indébito tributário é o direito, assegurado pelo artigo 165 do Código Tributário Nacional (CTN), que o contribuinte possui de buscar a recuperação total ou parcial dos valores pagos de forma indevida ou duplicada ao Fisco.

“É possível que o STJ, não obstante as premissas fixadas pelo STF, considere que esses valores representam acréscimo patrimonial dos contribuintes, sujeitos, portanto, ao IRPJ e CSLL”, explica.

O mesmo caso é citado pelo advogado Eduardo Ramos Jr., especialista em Direito Tributário da Weiss Advocacia, que alerta para falta de uniformidade jurisprudencial sobre o tema. 

“Os casos sobre incidência de IR e CSLL sobre Selic e correções monetárias estão sendo decididos caso a caso e com desfechos diferentes”, alerta.

Como exemplo, o especialista cita a atuação da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que possui julgados, por maioria de votos, aplicando o tema 962 em casos de levantamento de depósito judiciais tributários, decidindo pela não incidência do IRPJ e CSLL. 

“A 3ª e 6ª Turmas, por sua vez, já possuem entendimento que o paradigma do Tema 962 não alcança casos de Selic aplicada aos saldos de depósitos judiciais levantados pelo contribuinte em demandas tributárias e, portanto, reconhecem a exigibilidade da incidência de IRPJ e CSLL sobre Selic percebida no levantamento de depósitos judiciais, de acordo com o Tema 504 do STJ”, diz. 

Arthur Barreto, sócio da área Tributária do DSA Advogados, segue a mesma linha. “É provável que o mesmo entendimento seja aplicado em outros contextos envolvendo acréscimo patrimonial decorrente de atualizações de depósitos judiciais e também a atualização que incidir sobre tributos recuperados judicialmente”, diz. 

Mais cauteloso, o advogado Ruy Fernando Cortes de Campos, head tributário da Maia & Anjos advogados, acredita que o entendimento do STJ não será aplicado automaticamente em outros casos que não falam especificamente da mesma matéria. “Contudo, é possível, sim, que o raciocínio utilizado pelos ministros neste tema possa ser arrastado para todas as demais discussões que equiparem à renda quaisquer recebimento de valores a título de correção monetária, inclusive posicionamentos anteriormente consolidados em sentido contrário”, vislumbra. 

Possíveis debates
A sócia do contencioso tributário do Machado Associados, Maria Andréia F. dos S. Santos, já enxerga a possibilidade de a decisão do STJ impactar discussões que têm sido levadas ao Poder Judiciário de pessoas físicas. “Apesar da diferença existente entre a forma de tributação entre PJ e PF, há o risco de a jurisprudência se utilizar  dos mesmos critérios para avaliar a discussão sobre a pessoa física”, diz ao se referir a processos em que o contribuinte pede o reconhecimento do direito de que a parcela relativa à correção monetária de suas aplicações financeiras não sejam tributadas pelo IRPF.

Por fim, a advogada Maria Kaolina Araújo, especialista em Direito Tributário de Martorelli Advogados, entende que investimentos tanto de renda fixa quanto de renda variável já estão abrangidos pela decisão do STJ. “Para além disso, os fundamentos centrais utilizados pelos ministros no caso poderão ser utilizadas — e servir de incentivo — para a definição de debates que tratam da correção monetária em em outras esferas do Direito, como em discussões de cunho civilista“, prevê.

REsp. 1.986.304
REsp. 1.996.013
REsp. 1.996.014
REsp. 1.996.685
REsp. 1.996.784

Por Por Rafa Santos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Fonte: Revista Consultor Jurídico, 19 de março de 2023, 16h41